Um argumento cosmológico modal
Richard Gale e Alexander Pruss em 1999, no artigo “A New Cosmological Argument”, formularam um novo argumento cosmológico numa versão modal. Esse novo argumento baseia-se numa série de conceitos e distinções que precisam ser previamente clarificados. Em primeiro lugar, introduz-se um domínio fixo de proposições abstratas. Uma conjunção de proposição abstratas é máxima se, e só se, para cada proposição abstrata p, ou p ou não-p é um conjunto da conjunção. Além disso, um conjunto de proposições abstrata é compossível se, e só se, é conceptualmente ou logicamente possível que todos os conjuntos sejam verdadeiros simultaneamente.
Em segundo lugar, apresenta-se a seguinte definição de mundo possível: um mundo possível é uma coleção de seres e eventos ou estados de coisas que verifica ou torna verdadeiro todos os conjuntos de alguma conjunção máxima, compossível de proposição abstratas. Essa conjunção é designada de Grande Facto Conjuntivo desse mundo possível. Portanto, o Grande Facto Conjuntivo para um dado mundo possível inclui todas as proposições que seriam verdadeira se esse mundo fosse atualizado ou efetivo; sendo que cada mundo possível tem um e apenas um Grande Facto Conjuntivo. Assim, cada mundo possível é individuado pelo seu Grande Facto Conjuntivo.
Além disso, o Grande Facto Conjuntivo Contingente de algum mundo possível é a conjunção de todas as proposições contingentes que seriam verdadeiras se esse mundo fosse atual ou efetivo. Daí se segue imediatamente que o Grande Facto Conjuntivo Contingente de um mundo possível é máximo com respeito a proposições abstratas contingentes, sendo este incluído no seu Grande Facto Conjuntivo.
Em terceiro lugar, com este novo argumento cosmológico procura-se estabelecer que há um ser necessário que de forma intencional trouxe “o universo” à existência. Segundo Gale e Pruss, um universo de um mundo é o que verifica ou torna verdadeiro todos os conjuntos do Grande Facto Conjuntivo Contingente nesse mundo. Deste modo, um universo de um mundo possível é uma parte desse mundo possível.
Por fim, este novo argumento cosmológico baseia-se numa versão fraca do princípio de Leibniz da razão suficiente. De acordo com esse princípio, cada facto ou cada proposição verdadeira possivelmente tem uma explicação. Ou, por outras palavras, é a alegação de que para cada proposição p, se p é verdadeira, então é possível que exista uma proposição q tal que q explique p. Ou ainda de forma mais rigorosa:
- (PRSF) Para qualquer proposição, p, e qualquer mundo, w, se p está no Grande Facto Conjuntivo de w, então há algum mundo possível, w1, e proposição, q, tal que o Grande Facto Conjuntivo de w1 contém p e q e a proposição que q explica a p.
Com base nestas distinções e clarificações, já podemos formular o argumento do seguinte modo:
- 1. Se p1 é o Grande Facto Conjuntivo Contingente de um mundo w1 e p2 é o Grande Facto Conjuntivo Contingente de um mundo w2, e se p1 e p2 são idênticos, então w1 = w2. [Premissa]
- 2. p é o Grande Facto Conjuntivo Contingente do mundo atual. [Definição]
- 3. Para qualquer proposição, p’, e qualquer mundo, w, se p’ está no Grande Facto Conjuntivo de w, então há algum mundo possível, w1, e proposição, q, tal que o Grande Facto Conjuntivo de w1 contém p’ e q e a proposição que q explica a p’. [Premissa, (PRSF)]
- 4. ∴ Se p está no Grande Facto Conjuntivo do mundo atual, então há algum mundo possível, w1, e proposição, q, tal que o Grande Facto Conjuntivo de w1 contém p e q e a proposição que q explica a p. [De 3]
- 5. ∴ Há um mundo possível w1 e uma proposição q, tal que o Grande Facto Conjuntivo de w1 contém p e q e a proposição que q explica a p. [De 2 e 3, por modus ponens]
- 6. ∴ w1 = o mundo atual. [De 1, 2, e 5]
- 7. ∴ Há no mundo atual uma proposição q, tal que o Grande Facto Conjuntivo do mundo atual contém p e q e a proposição que q explica p. [De 5 e 6]
- 8. q é ou uma explicação pessoal ou q é uma explicação científica. [Premissa]
- 9. q não é uma explicação científica (dado que todas as leis científicas relevantes estão contidas como conjuntas no explanandum, e as leis não são auto-explicativas). [premissa]
- 10. ∴ q é uma explicação pessoal. [De 8 e 9, por silogismo disjuntivo]
- 11. ∴ q reporta a ação intencional de um ser contingente ou q reporta a ação intencional de um ser necessário. [De 10]
- 12. Não é o caso que q reporte a ação intencional de um ser contingente (dado que um ser contingente não pode produzir a sua própria existência). [Premissa]
- 13. ∴ q reporta a ação intencional de um ser necessário. [De 11 e 12, por silogismo disjuntivo]
- 14. ∴ q é uma proposição contingente que reporta a ação intencional de um ser necessário. [De 1, 2, e 13]
- 15. ∴ q é uma proposição contingente que reporta a ação intencional de um ser necessário que explica a existência do universo no mundo atual (dado que o Grande Facto Conjuntivo Contingente reporta a existência do universo no mundo atual). [De 14]
- 16. ∴ É contingentemente verdade que há um ser necessário que intencionalmente criou o universo no mundo atual. [De 15] (QED)
Este argumento é válido. Mas será sólido? Temos alguma boa razão para rejeitar o princípio (PRSF)?